sábado, 14 de abril de 2012

AS «APSARAS» DO REINO DE ANGKOR

O escritor Ferreira de Castro descreve assim no seu livro " A VOLTA AO MUNDO II" (publicado em 1944), a sua passagem pelo Camboja e a sua visita ao reino de ANGKOR, uma das Maravilhas Artisticas do Mundo. A Ele, que eu conheci pessoalmente e que me inspirou nesta mesma viagem, ao mesmo lugar, eu devo-lhe  esta homenagem:

"Estamos em TA-PROHM - um dos santuários - das enegrecidas paredes que ainda se mantêm  de pé surgem as «APSARAS» - deliciosas figuras femininas em baixo-relevo de seiozitos eretos e de pés, com escravas, volvidos para um só lado......"


                 Havíam passado cerca  de sete décadas e ali estava eu,só com o meu guia cambojano, poucos minutos depois das 5 horas da manhã, sentados numa pedra do Templo. Entre um silêncio sepulcral, os primeiros raios de sol perfuravam as nuvens expessas num céu pintado de negro, uma luz diáfana e purpura iluminava a floresta ainda adormecida e reflectia-se no lago.
 Jacques tentava chamar a minha atenção com palavras suaves, contando a tragédia do País e o sofrimento da familia que perdeu, durante as guerras sucessivas.

De repente uma outra voz, na minha lingua materna, segredou-me ao ouvido:
 "É chegado o momento de conhecer uma das maravilhas do Mundo"........

      
...."ao primeiro contacto visual este enorme «ANGKOR VAT» parece, sempre que o Sol não o envolva de refulgências, uma obra de rudes linhas e cheia de arestas, logo porém que se examinem trecho por trecho e se descontem as feridas deixadas pelos séculos, um marvilhoso feito de arte, uma maravilhosa façanha da arquitectura e da escultura estadeia-se deslumbradoramente perante nós....."



"Os arquitectos quemeres começaram por sofrer influências da INDIA, a mãe religiosa e acabaram por superar os próprios monumentos hindus que os havíam inspirado. E, com este santuário, sua esplendorosa gloria, eles influenciaram, por sua vez, a arquitectura dos reinos vizinhos, sobretudo a do Sião" 





.."a incomparável sumptuosidade de «Angkor Vat» começa logo na primeira galeria. E tão extensa 
esta se mostra que percorrê-la toda é fazer uma longa viagem . uma viagem em que  as pernas  se fatigam e o espírito se assombra.........." 



.
..."animais preciosamente estilizados andam perto das «APSARAS», estas ternas figuras femininas que se vêm em quase todos os templos de ANGKOR e ficarão na memória de quem  visite Angkor como como a mais delicada e perene graça dos seus monumentos. Mulheres divinas, nascidas da água, segundo velha lenda, as «APSARAS» de ANGKOR VAT ostentam sempre os seios eretos e o tronco nu, como as suas irmãs de outros santuários, mas artisticamente são muito mais perfeitas. Elas bailam, elas tocam, elas compõem a sua toilettle e exibem objectos profanos e sagrados..."

"....Celestes pela lenda, os anónimos artistas deste templo deram-lhes uma surpreendente humanidade e, mais do que os prazeres do  céu quemer, elas parecem cantar, com as suas vistosas ancas e seios nus, o mistério da maternidade."

     

Ferreira de Castro descreve com detalhe cirurgico as maravilhas deste Reino, com uma sensibilidade única, com uma intensa paixão pelo desconhecido e com um verdadeiro amor á arte ele se fascina e consigo leva o leitor a sonhar com as suas viagens, incuntindo-lhes um desmedido desejo de seguirem o seu trilho. E, assim, me encontrei no Camboja. Não me desiludi, tal como o escritor também me apaixonei por este Reino perdido, pela beleza e a perfeição das suas esculturas, pelo mistério que envolve estes templos, pela magia que  paira no ar, este é um lugar sagrado digno de ser visitado.

Assim ele descreve o final da visita a ANGKOR:

"As ruínas de ANGKOR são das poucas coisas do Mundo que justificam e ultrapassam a sua própria fama. Á noite tudo se transfigura; o grande templo, as gentis «APSARAS» nele esculpidas e a selva onde vivem os elefantes bravos, tigres e panteras".

"Raparigas cambojanas bailam em frente do ANGKOR VAT ...mil lumaréus, mil tochas queimam as trevas na enorme galeria de ANGKOR VAT. E as cambojanas bailam. Vimo-las primeiro esculpidas nas pilastras dos templos e a única diferença entre as bailarinas de pedra e as de carne é que estas em vez de torso nu trazem um corpete e calções, faixas bamboleantes, de rubras e doiradas escamas. na cabeça luzem um capacete pontiagudo, em forma de torre, metálico todo ele e com pedras incrustadas. Nos ombros vê-se-lhes um principio de asas e, sobre os pés nus, junto dos artelhos,várias argolas".  







".....Os movimentos dos corpos são lentos,duma lentidão de sonho;"

"e, de quando em quando, as pernas formam ângulos e os braços distendem-se hieraticamente...tudo é estranho. As atitudes das bailarinas, as mascaras que entre elas surgem, a selva que em derredor escuta e as moles de pedra do «Angkor Vat» que se erguem atrás e  flamejam na noite cambojana......."

"Queremos agarrar-nos a uma visão terrestre mas não é possível"



fotos: Helena Afonso

domingo, 1 de abril de 2012

A ALDEIA FLUTUANTE

- NO LAGO TONLE SAP -


Esta aldeia flututante nos recônditos deste lago paradisíaco, o maior do Sudeste Asiático, em pleno teritório Cambojano, parece não ter vivido, nem sofrido, os massacres das guerras sucessivas que assolaram todo o pais, durante varias décadas e que dizimaram a maioria da população. Foi uma doce PAZ e tranquilidade imensa, em tons de azul, que nos acompanhou desde o início ao final da visita ao TONLE SAP - lago de água fresca - (em lingua kmer), foi mesmo essa frescura deliciosa que sentimos na travessia, embora o calor intenso já inundassse aquele lugar.........

Parece até que o tempo parou e o "inferno" criado pelos kmer vermelhos ali não passou!

KAMPONG PHLUK  é uma das três aldeias flutuantes do lago. Habitada na sua maioria por gente de etnia KMER,  a aldeia compôe-se dum população de cerca de 3000 pessoas, vivendo em casas de madeira contruídas sobre estacas, ou "palafitas".

Chegámos cedo, no pequeno barco a motor, com uma ansia enorme de ver e fotografar.....já eu adivinhava que me iria deslumbrar.....

A grande"casa amarela" surgiu a flutuar, isolada, como se fosse a guardiã daquela entrada- " GENDARMERY" era o título que sobressaía na sua fachada - um "francesismo", herança da ocupação francesa por estas paragens...na era da "Indochina".

Fomos avançando devagar, em silêncio, como se quizéssemos entrar num reino proibido, mas  decerto muito apetecido.


Logo ali - "Kampong Phluk community fishery office"    todo em madeira pintada  de azul, surgiu um casarão, como um grande  barracão, estacas altas, varanda a toda a volta, portas abertas com janelas, mas sem sentinelas, o departamento dos pescadores, (sendo a pesca o maior fonte de rendimento deste lago) mais parecia um OVNI flutuante...talvez sim, talvez não....!

E  finalmente chegámos; já se via a aldeia, as casitas pintadas, os barcos, as canoas, as pessoas, a azáfama.......do dia......todos num movimento coordenado, como num brinquedo de corda que em sincronia se moviam.......

Parámos à frente da primeira casa, toda  de madeira e palha, o pequeno cortiço dos animais, um varandim com florinhas singelas, amarelas, reflectindo-se no lago, como uma aguarela numa tela, de um qualquer famoso pintor.....ou fazendo parte duma novela dum famoso escritor! 


Deslizáva a primeira canoa, movia-se sem pressa, UMA MULHER MUITO CONCENTRADA NO MOVIMENTO LENTO, SEMPRE EM FRENTE  MUITO DIREITA e DE  PÉ.
Novamente um quadro dum pintor....cativou-me logo o olhar. Fotografar, era aqui chegado o momento......


Á medida que penetrava naquele mundo, para mim ainda desconhecido, mas que já me envolvia, mais eu me encantava e lá  a vida não parava. Passavam as canoas, abarrotadas de frutas, os plásticos, a plantas, os animais, sempre em silêncio, tudo naquelas águas refletido, servia ao comércio daquele mercado colorido e flutuante...!




As flores, sempres as flores, lindas e frescas, enfeitando os varandins e as  portas eram o adorno principal daquelas casitas  coloridas, onde não havia luxo, mas resplandecia a simplicidade e a harmonia. A vida  quotidiana neste quadro fascinante onde tudo acontece ao ar livre, um mulher, na sua pequena canoa lavava os cabelos longos. Com o xampô, de marca, esfregava e enxaguava com a água do lago, deliciava-se e ria de prazer.....aproximei-me  a medo, ela não se intimidou, olhou, sorriu e depois posou...iradiava alegria!


Mudámos a direcção e entrámos noutro canal, neste  serpentear de canais labirinticos, como numa Veneza Oriental, onde as gondolas eram canoas, os grandes palácios revestidos de arte eram aqui  as  casitas simples, mas tal como lá, aqui se ouvia uma sinfonia......se  sentia POESIA........ 

E eis que surgem as torres cónicas e douradas, resplandecentes, dos templos budistas...denunciando a religião desta comunidade, a oficial deste País das Maravilhas! 



- BUDA é o ILUMINADO -
Os seus ensinamentos visam obter um estado de perfeita saúde mental, de equilibrio e de tranquilidade

A visita a esta aldeia foi para mim um meio de encontrar estes ensinamentos!

Embora tenha predominado o "Induísmo" na época pré-Angkoriana, o Budismo foi introduzido nos séculos XIII e XIV até 1975, altura em que os KMERS VERMELHOS (1975-1979) assassinaram os monges  e destruiram os cerca de 3000 templos budistas.
Mas a religião regressou no final dos anos 80 com os velhos monges  ainda sobreviventes e hoje já os novos monges estudam e aqueles que abraçam os votos definitivos dedicam-se ao ensino da religião.

Retomámos o caminho da cidade. De regresso à "civilização", esperava-me um belo jantar no meu luxuoso Hotel, um show de danças APSARAS, os ingredientes perfeitos aos valores ocidentais......
Mas o ponto alto daquele dia foi para mim no lago, a travessia, lá onde reina a PAZ e a HARMONIA, onde convivem a beleza natural e a condição humana genuína, lá onde encontrei o verdadeiro ALIMENTO da ALMA!