domingo, 25 de março de 2012

O LAGO TONLE SAP

"O CORAÇÃO FLUTUANTE DO CAMBOJA"


"On my journey up the river and across de lake I read.......
"THE TRAVELS IN INDOCHINE"  - of Henry Mouhot, a french naturalist, who was the first european to give a detailed description of the ruins of ANGKOR "-  (Somerset Maugham - The gentleman in the Parlour 1929)

Somerset Maugham foi o meu ídolo-escritor na fase da minha adolescencia,
li-o e  reli-o, ainda em África, onde nasci e onde sonhava com as rotas do mítico Oriente e com as viagens pelo mundo Asiático, genialmente descritas nas suas novelas e romances. Eu sabia que um dia iria viver aquele sonho e mergulhar naquelas aventuras... e esse dia chegou!

Ainda era cedo, mas o sol já escaldava e Siem Riep acordava....Meti-me a caminho só com o meu chauffeur "kmer", no seu pequeno tuk-tuk escrupulosamente limpo e arranjado. Á porta do meu hotel, á hora marcada, já ele me esperava com um enorme "bonjours Madame" e  esfregava e polía mais uma vez os latões dourados que resplandecíam e enfeitavam o veículo.....digno duma novela de Maugham!


Eu balançava no banco de trás ao ritmo do asfalto empedrado, na unica e estreita avenida  que liga a cidade ao lago TONLE SAP, para onde me dirigia. O som estridente da buzina cortava o silencio da paisagem rural, onde os bois avançavam numa caminhada lenta e pachorrenta à frente dos pastores que os conduziam ao trabalho.
A viagem, desengonçada mas divertida,  não afastava os meus pensamentos; sentia-me a "heroína" do meu escritor favorito e inspirador, que há já muitas décadas atrás havia percorrido aquela mesma rota, atravessando aquele mesmo lago que eu estava prestes a encontrar,  vindo pelo Rio Mekong para Siem Reap a fim de visitar e descobrir os belos Templos de ANGKOR.
Também eu havia havía visitado no dia anterior uma das maravilhas do Mundo - ANGKOR-WAT - e o cenário místico e a magnificência da arte "KMER" ,considerada patrimonio Mundial pela UNESCO, ainda me absorvía e envolvia naquela onda de sonho que me acompanhava na jornada.......

De onde a onde surgiam grandes mansões à beira da estrada, reminiscências da ocupação francesa, quando o país era ainda INDOCHINA (antes das guerras que devastaram o país, dizimaram populações inteiras e destruiram muito das origens e cultura do povo KMER ). De arquitectura euro-asiática era impressionante a sua imponência em contraste com os casebres humildes das gentes que habitam aquela  região.

Os campos estavam alagados das chuvas torrenciais que tinham caído nos ultimos meses, era o final da época das monções, mas a chuva teimava em não parar. Vi os bufalos de água mergulhados até ao pescoço, regalados nas "piscinas naturais" ; aproximei-me de mansinho e caminhei devagar.......

Naqueles olhos doces fixei o meu olhar...
era corpulento e negro,
mas não me meteu medo.
Apontei a minh camara
às orelhas enormes e abertas
áqueles chifres duros e curvos
e ele ali ficou, estático, álerta!
Seria o meu modelo certo,
naquele canto do mundo  deserto?

Ali fiquei a pasmar,
Até o meu guia me chamar.......


Saímos da estrada e enfiámos por um estreito trilho de terra batida e encharcada, cercado pela floresta.
Os solavancos  fazíam-me pular no assento e bater com a cabeça no tecto, algumas crianças corriam assustadas e atravessavam-se à nossa frente, ouviam-se latidos dos cães e os gritos da bicharada, os macacos pulavam nas arvores, contentes pela nossa passagem.......


Chegámos à beira do lago, onde os barqueiros nos esperavam impacientes. Embora seja este um destino turistico  obrigatório, não vi ninguém de perfil ocidental. Iniciámos a travessia. Alguns pescadores deslizávam em silêncio com as suas delicadas canoas, apoiados numa vara comprida que usavam para avançar como remos, apenas uma vegetação cobria o lago, como um tapete verde de plantas aquáticas que flutuava.

                O LAGO TONLE SAP NÃO É APENAS UM LAGO, MAS UM MODO DE VIDA! 

Mais de um milhão de cambojanos dependem dos recursos naturais deste  lago, na época das chuvas o lago estende-se a todo o país e liga-se ao mítico RIO MEKONG proveniente do Tibete, tornando-se no maior lago de água doce do Sudeste Asiático, alastrando as suas  águas calmas por 12.000km2.

O LAGO TONLE SAP faz parte  da  famosa e rica Reserva da Biosfera, sendo considerado um SANTUÁRIO, onde habitam mais de 100 espécies de pássaros e peixes, crocodilos, tartarugas, macacos que se espalham pela longa e inundada floresta de "mangrove" .

Vivendo em harmonia com o ecosistema, as gentes que habitam as aldeias flutuantes vivem em casas da madeira, construídas em palafitas, mantendo uma economia e um modo de vida interligada com a ecologia do lago, a vida selvagem e o ciclo de subida e  descida das águas.
O lago situado a apenas 15kms  ao sul de Siem Reap é  ligado à capital, Phnom Penh,  por barco diário.


Avisto a primeira casa, uma enorme estrutura de madeira em linhas orientais, sede  do governo local,  possivelmente, onde sobressaem os telhados vermelhos de bicos revirados contrastando com o azul intenso do céu e do lago. Uma árvore gigante semi-submersa, escondendo a primeira casa, deixa apenas de fora a copa  frondosa, como o guardião atento da aldeia flutuante que se avizinha.




terça-feira, 6 de março de 2012

"A MINHA DOR"

   



A minha Dor é um convento ideal
Cheio de claustros, sombras, arcarias,
Aonde a pedra em convulsões sombrias
Tem linhas dum requinte escultural!


Os sinos têm dobres de agonias
Ao gemer, comovidos, o seu mal...
E todos têm sons de funeral
Ao bater horas, no decorrer dos dias.....    
A minha Dor é um convento. Há lírios
Dum roxo macerado de martírios
Tão belos como nunca os viu ninguém!
Nesse triste convento aonde eu moro,
Noites e dias rezo e grito e choro,
E ninguém ouve...ninguém vê...ninguém...




                             
                      Florbela Espanca (Livro de Mágoas-1919)





sábado, 3 de março de 2012

"AS ILHAS DE PEDRA" da BAÍA DE HALONG



"No Oriente diz-se que a Indochina é senhora de três maravilhas:  as ruínas de ANGKOR, os tumulos imperiais de Hué e a Baía de Along. Já vimos as duas primeiras, vamos agora contemplar a ultima . Lá em baixo, na nossa frente, a Baía de Along. Da grande toalha de água esmeraldina, serena como a dum lago, irrompem centenas, milhares talvez, de pequeninas  ilhas, altos rochedos de caprichosas formas, de fantásticos perfis e cobertas de rala vegetação. Entre essas minusculas ilhas, juncos chineses abrem as suas austeras velas. Não se vê de parte alguma o mar largo. Só se divisam ilhas, umas semelham obeliscos , outras lembram torres, aquelas recordam falos, outras apresentam-se como rudes cabeças humanas, queloutras imitam corpos pré-históricos. Simples rochedos revestidos de arbustos, entregando ao sol a sua capa verde, um arquipelago fantasmagórico"
                                              (Ferreira de Castro - "A Volta Ao Mundo" - 1944)







As ilhas de pedra nascem do mar,
o local é divino, esconde histórias de encantar,
 os barcos navegam em silêncio,
os turistas suspiram,
há já sonhos no ar!





Os locais vêem visitar,
vendem frutos, peixes, pérolas e eu sei lá o que mais,                      
nós recusamos,
só queremos aquela mulher de  mascara branca,
que  vem à janela,
ela faz gestos, não sabe falar,
mas posa e deixa-se fotografar......
É a luta pela vida de quem nada tem para dar.....
um cacho de bananas, uma laranja
não querem comprar?
A emoção cresce no coração,
um nó na garganta aperta.
Naquela janela aberta.
Uma lágrima se solta, meus olhos não vêem,
mas sentem.........


e o barco sempre a navegar.......a navegar.......
entre o azul do céu e o verde do mar.............
até que pára à beira dum cais,
vamos ver  as grutas e já se ouvem os ais .....
vamos desembarcar!

"A MORADA DOS DEUSES"


Entrámos então naquela morada,
pelos Deuses decorada,
esculturas, fantasmas, palhaços
estendem os braços,


imaginação, ilusão ou só impressão??       



   São monstros marinhos,
  aves gigantes, ou são só  ninhos?
  Sou Alice, no País das Maravilhas,
  quero saír, quero ficar,
   já estou presa áquele fascínio,
  à magia daquele lugar,
  donde não mais quero voltar!

"Á tarde visitamos a caverna das Surpresas e a caverna das Maravilhas,  grutas naturais de onde  por entre as estalactites se descortinam as sucessivas ilhas da Baía de Along, um mundo de configurações impressionantes. Para os próprios chineses isto  era tão estranho, que a sua mitologia  indica este singular arquipélago como sendo a residência do Dragão do Mar!"  (Ferreira de Castro)